23.6.06

Jesus tinha terreiro na Roma Negra


Hoje acordei com um recado de Ed Bala, dizendo que a banda dele tocará no Terreiro de Jesus. Fiquei pensando: “o único terreiro que conheço é do Ala Ketu, o de Jesus não sei onde fica não”.
Não sei se foi por causa do sono ou dou calmante que tomei ontem, que a ficha demorou pra cair. Aí como sempre, cair na risada. E pensei na frase de Octavio Mangabeira (governador da Bahia de 1946-50): “Pense no impossível... acontece na Bahia”. Pois é! Aqui na Bahia, ou melhor, na capital baiana – A Roma Negra – até Jesus tem terreiro.
O Terreiro de Jesus, fica colado ao Pelourinho e é nesse terreiro ("espaço de terra livre, grande e aplainado"), que fica a Catedral Basílica de Salvador e as Igrejas de São Francisco, São Domingos e (salvo erro) a de Nossa Senhora do Carmo.
O mais interessante, é que nunca vi nenhum protestante, católico, espírita ou evangélico reclamar do nome, pelo contrário, no carnaval vai todo mundo para lá com um bloco, uns pedindo paz, outros pedindo para acabar com essa festa profana e outros como eu, que adora ouvir os atabaques e ver a “negrada que faz o astral da avenida”, a desculpa é diferente, mas está todo mundo lá.
Se alguém ainda se lembra da frase de Octavio Mangabeira, que tem mais de 5 décadas, provavelmente se lembra de que há 5 meses, o nosso querido Padre Pinto rodou a baiana.
O Terreiro de Jesus é mais antigo que o Padre Pinto, se Jesus pode ter terreiro, por que o Padre Pinto não pode ter?Se bem que o caso do Padre Pinto é diferente. Leandro Colling, no Olho Queer ao citar, Antonio Risério, afirma que “a novidade do padre Pinto, portanto, esteve em juntar as duas coisas, veadagem e candomblé, dentro da igreja, em performance explicitamente carnavalesca, numa sociedade midiática. Sucesso imediato, explosivo e total. Daí a campanha atual dos internautas baianos: ‘Padre Pinto Para Papa’.”.
Sei que aqui na Bahia existe uma enorme miscelânea religiosa. Miscelânea mesmo, não é sincretismos não. Pois no Cadomblé, Jesus é Oxalá, mas se divide em Oxalufã e Oxoguian e esses dois existiram na África (não sei a época, mas sei que existiram mesmo). Então não podem ser a mesma pessoa com nome diferente. Se bem que pode sim, aí a gente já coloca a doutrina de Allan Kardec – espiritismo – no meio, para dizer que um é a encarnação do outro.
E nesse balaio de gato, ainda temos os costumes de um na religião do outro. O que tem de católicos que não acreditam em ressurreição mas sim em reencarnação, não é brincadeira. Ou então, o cara fala que é evangélico e quando diz “Deus é mais” faz o ato tipicamente do Candomblé – BATE NA MADEIRA TRÊS VEZES. Sem falar dos pastores que colocam um copo d’água na mesa, que nem nos centros espíritas. E quem é que aqui na Bahia (que não tenha problemas com azeite de dendê) resiste á um bom acarajé? Comida genuinamente africana.
Com isso tudo eu já nem sei quem é que eu sou. Quem souber, deixe um comentário, que eu ficarei eternamente grato.
jp

21.6.06

Monografia, carona e enterro

Meu queridís- simo amigo Gustavo pe- diu para con- tar o que fiz para econo- mizar dinheiro de transpor-te, para fa- zer a mono.
Todo mundo sabe, que o tema da minha monografia foi a História do Fotojornalismo em Salvador de 1930 á 2000. Além de entrevistar fotógrafos renomados na capital baiana, tive que ir a bibliotecas, no instituto histórico e no Arquivo Público da Bahia.

As bibliotecas e o Instituto Histórico ficam a caminho da faculdade, quase todos os ônibus que passam na porta da casa da minha avó passam por lá. O problema foi o Arquivo Público da Bahia – APB.

Só sei ir para o APB de carro – dez reais de gasolina é de lenha o bolso de qualquer estudante – e não tem ônibus direto da casa da minha avó ou da casa do meu pai que passe perto de lá. Tinha que andar quase dois quilômetros e pegar dois ônibus.

Chegava lá suado, cansado e para piorar a minha situação, perdi o meu cartão de meia passagem, eu tinha que pagar inteira.

O APB fica localizado no Bairro da Baixa de Quintas, na antiga residência do padre Antônio Vieira. Esse bairro é conhecido por ser onde Acelino Popó nasceu e á 300 metros de lá, fica uma espécie de complexos de cemitérios, cinco no total (Ordem Terceira de São Francisco, Ordem Terceira do Carmo, Quinta de São Lázaro; Cemitério Israelita e Santíssimo Sacramento).

Uma bela segunda-feira, eu fui para casa de um amigo – Bob Grilo – que mora na rua atrás da minha, para desmarcamos o que iríamos fazer naquela manhã, porque tinha que ir para o APB.

Quando cheguei na rua dele tinha gente como a zorra, incluindo ele. Eu perguntei: “O que houve Bob?”. E ele respondeu: “Um vizinho nosso que morreu e estamos esperando o ônibus para levar a gente para o enterro”.

Naquela hora passou um flash back na minha cabeça (vou andar uns 1200 metros até a Baixa do Fiscal, atravessar a linha do trem, pegar dois ônibus pra ir, mais dois pra voltar, vou gastar seis reais, vou ficar no ponto esperando, vou chegar suado...).

Eu pensei: “sabe de uma? Eu vou é no buzu do enterro, (o assento é acolchoado e ainda tem ar condincionado), falo com o pessoal lá no cemitério, desço correndo para o APB, faço que tenho que fazer e volto para pegar a extrema unção”.

Então eu fui! Quando cheguei lá, não sabia nem quem tinha morrido. Falei com um, falei com outro, vi o pessoal chorando dizendo que o finado era uma boa pessoa e sair para tomar (ou comer) água. Eu fiz o mesmo – vou ali beber água e volto.

Beber água nada! Desci correndo a ladeira e fui no APB fazer as minhas pesquisas e tirar as fotografias. Só que a primeira vez demorou um pouco, pois tive que pedir autorização da diretora de lá.

Mas Deus - como sempre - me ajudou e nesse dia o funeral atrasou como quê, só tinha um padre para encomendar as almas ele ainda estava com dor de barriga. Então eu fiz o que tinha que fazer e ainda deu tempo para voltar e ajudar a carrega o caixão (pesado como a porra) debaixo de chuva – era o mínimo que podia fazer pela carona que peguei.

Na segunda-feira seguinte, outro enterro. Pôxa! Eu não pedi para ninguém morrer, eu pedi que Deus me desse outra boleia, pegar carona não é pecado. Foram seis enterros. Não conhecia nem de nome nenhum dos desencarnados, mas o pessoal conhecia o meu pai e eu dizia: “meu pai não pôde vim e me mandou no lugar dele”.

Só sei que economizei 36 reais e a minha monografia foi aprovada.

Um abração
jp

19.6.06

Elogios ou críticas???

Ultimamente tenho sido adjetivado – pois não sei se estão me elogiando ou esculhambando – com palavras pouco simpáticas como: inconseqüente (“Contrário ao que naturalmente se devia seguir”) e mercenário (“individuo que trabalha por soldo ajustado ou somente por interesse no pagamento) passional (“Motivado pela paixão, especialmente amorosa”), autoritário (que se impõe pela autoridade) e outras mais.

A vontade que tive, foi de perguntar se essas pessoas sabem o que realmente estão dizendo, mas fiquei com medo de ser chamado de prepotente. É que minha dúvida, é se essas palavras que me foram dirigidas são elogios ou críticas.

Se soubéssemos o que naturalmente se deve seguir o mundo seria outra, mas
Vinicius de Moraes disse que “ninguém vai me dizer que tem” que seguir “sem provar muito bem provado, com certidão passada em cartório do céu e assinado embaixo: Deus. E com firma reconhecida”.

Se no mundo não houvesse inconseqüentes, estaríamos andando de carroça e ainda não teríamos chegado na era do rádio.

Me responda aí? Quem nesse mundo trabalha de graça? Todo mundo que eu conheço não move uma palha sem saber o que vão ganhar com isso. E eu, que trabalho como voluntário em ONG que sou mercenário. Mas eu ainda quero ser mercenário, pois uma pessoa que ganha pelo seu trabalho é uma pessoa valorizada.

Passional e autoritário, um eu já sou e outro eu quero ser. Pois tudo o que eu faço é por amor, para não correr o risco de ficar esperando algo em troca. E ainda não sou autoridade (pessoa tida como mestre em um assunto) para ser autoritário.

Talvez, eu esteja sendo inconseqüente, por levar estas palavras para o lado mais simpático. Mas isso eu aprendi com uma história que Divaldo Franco contou.
Ele contou que quando era mais novo, um grupo de rapazes perto do trabalho dele gostava de chamar as mulheres que passavam por lá de sereias, tainhas, salmão e outros peixes bonitos e saborosos. Até que uma mocinha com aspecto menos bonito, passou por eles para saber o que eles acharam dela. Quando ela passou por eles foi chamada de bacalhau. Ela voltou feliz da vida com a comparação. Divaldo então perguntou: “eles te chamaram de bacalhau e você fica contente?” . A moça respondeu : “Bacalhau também não é peixe?”.

As palavras possuem forças, que levantam ou derrubam qualquer um, mas tudo depende de como a gente absorve cada uma delas.

Ah! E obrigado pelos elogios.

jp